segunda-feira, 15 de junho de 2009

baú

"Momento é por definição o instante irrepetível. A música é pois, ainda que de forma estranhamente paradoxal, a arte de tornar perene o momento, estruturada que é no conceito de tempo e da repetição encantatória deste. Assim construí eu este disco. Uma maneira de tornar eternos os meus instantes, de os lançar como nuvens invisíveis sobre o céu carregado das melodias que me ensombram. Aqui habitam todos os fantasmas, as obsessões, as loucuras possíveis e todas as outras que não cheguei ainda a pronunciar. Das palavras faço canções que me fintam e se perdem por entre a harmonia seca de um piano qualquer. São as esquinas da cidade que me seduzem, mulheres vestidas de maquilhagem carregada, vultos escorregadios que tecem a noite como pássaros silenciosos, madrugadas encantadas entre as pegadas de um areal molhado pela chuva imprecisa. Os meus momentos são banais e por isso os canto. Esta vontade que tenho de tornar o real numa canção que repito até que outra canção me surja do sonho. Elas são o mundo a pulsar a cada piscar de olhos, o lento crescer de um lírio num deserto de cetim e cimento, as letras esbatidas de um jornal que ninguém lerá. Este é o meu Momento. Assim se cumprirão nas vossas mãos os meus instantes irrepetíveis."

Li isto em 2002. Já passaram tempos e vidas e pessoas.
Isto ficou na memória, não naquela presente de todos os dias, como lembrança de telemóvel, mas sim como marca gravada e perdida no subconsciente, apenas usada quando precisa, mas nunca definida como tal.
Era o ano de 2002, tinha eu uns 14 anos. Abri a caixa e o CD saltou para as minhas mãos e das minhas mãos para o meu adorado Discman da Sony - um estrondo da época. Phones nos ouvidos. Play. E foi aqui, foi neste preciso momento que eu comecei a dar sentido às palavras; que eu realmente comecei a ouvir a música, sem ser apenas porque toda a gente a ouvia. Lembro-me: sentei-me no chão a consumir letras e palavras e a crescer muito.
Hoje voltei ao discman velhinho, que já não tocava há tanto mas tanto tempo. Talvez desde 2003. Temi que ele já nem funcionasse. O CD estava lá. Sentei-me no mesmo chão. Phones nos ouvidos. Play. Chamava-se Momento.

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